7 de ago. de 2011

Coisa...

Não sei quem é o autor dessa coisa, mas só sei que essa coisa é uma coisa boa de ler.
• A palavra coisa é um bombril do idioma. Tem mil e uma utilidades. É aquele tipo de termo-muleta ao qual a gente recorre sempre que nos faltam palavras para exprimir uma ideia. Coisas do Português...
• A natureza das coisas: gramaticalmente, coisa pode ser substantivo, adjetivo, advérbio. Também pode ser verbo: o Houaiss registra a forma coisificar. E no Nordeste há coisar: Ô, seu coisinha, você já coisou aquela coisa que eu mandei você coisar?
• Coisar, em Portugal, equivale ao ato sexual, lembra Josué Machado. Já as coisas" nordestinas são sinônimas dos órgãos genitais, registra o Aurélio. E deixava-se possuir pelo amante, que lhe beijava os pés, as coisas, os seios (Riacho Doce, José Lins do Rego). Na Paraíba e em Pernambuco, coisa também é cigarro de maconha.
• Em Olinda, o bloco carnavalesco Segura a Coisa tem um baseado como símbolo em seu estandarte. Alceu Valença canta: Segura a coisa com muito cuidado/Que eu chego já. E, como em Olinda sempre há bloco mirim equivalente ao de gente grande, há também o Segura a Coisinha.
• Na literatura, a coisa é coisa antiga. Antiga, mas modernista: Oswald de Andrade escreveu a crônica O Coisa em 1943. A Coisa é título de romance de Stephen King. Simone de Beauvoir escreveu A Força das Coisas, e Michel Foucault, As Palavras e as Coisas.
• Em Minas Gerais, todas as coisas são chamadas de trem. Menos o trem, que lá é chamado de a coisa. A mãe está com a filha na estação, o trem se aproxima e ela diz: Minha filha, pega os trem que lá vem a coisa!
• Devido lugar: Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça (...). A garota de Ipanema era coisa de fechar o Rio de Janeiro. Mas se ela voltar, se ela voltar/ Que coisa linda/Que coisa louca. Coisas de Jobim e de Vinicius, que sabiam das coisas.
• Sampa também tem dessas coisas (coisa de louco!), seja quando canta Alguma coisa acontece no meu coração", de Caetano Veloso, ou quando vê o Show de Calouros, do Silvio Santos (que é coisa nossa).
• Coisa não tem sexo: pode ser masculino ou feminino. Coisa-ruim é o capeta. Coisa boa é a Juliana Paes. Nunca vi coisa assim!
• Coisa de cinema! A Coisa virou nome de filme de Hollywood, que tinha o seu Coisa no recente Quarteto Fantástico. Extraído dos quadrinhos, na TV o personagem ganhou também desenho animado, nos anos 70. E no programa Casseta e Planeta, Urgente!, Marcelo Madureira faz o personagem Coisinha de Jesus.
• Coisa também não tem tamanho. Na boca dos exagerados, coisa nenhuma vira coisíssima. Mas a coisa tem história na MPB. No II Festival da Música Popular Brasileira, em 1966, estava na letra das duas vencedoras: Disparada, de Geraldo Vandré (Prepare seu coração/ pras coisas que eu vou contar), e A Banda, de Chico Buarque (Pra ver a banda passar/Cantando coisas de amor), que acabou de ser relançada num dos CDs triplos do compositor, que a Som Livre remasterizou. Naquele ano do festival, no entanto, a coisa tava preta (ou melhor, verde-oliva). E a turma da Jovem Guarda não tava nem aí com as coisas: Coisa linda/Coisa que eu adoro".
• Cheio das coisas. As mesmas coisas, Coisa bonita, Coisas do coração, Coisas que não se esquece, Diga-me coisas bonitas, Tem coisas que a gente não tira do coração. Todas essas coisas são títulos de canções interpretadas por Roberto Carlos, o rei das coisas. Como ele, uma geração da MPB era preocupada com as coisas.
• Para Maria Bethânia, o diminutivo de coisa é uma questão de quantidade (afinal, são tantas coisinhas miúdas). Já para Beth Carvalho, é de carinho e intensidade (ô coisinha tão bonitinha do pai). Todas as Coisas e Eu é título de CD de Gal. Esse papo já tá qualquer coisa...Já qualquer coisa doida dentro mexe. Essa coisa doida é uma citação da música Qualquer Coisa, de Caetano, que canta também: Alguma coisa está fora da ordem.
• Por essas e por outras, é preciso colocar cada coisa no devido lugar. Uma coisa de cada vez, é claro, pois uma coisa é uma coisa; outra coisa é outra coisa. E tal coisa, e coisa e tal. O cheio de coisas é o indivíduo chato, pleno de não-me-toques. O cheio das coisas, por sua vez, é o sujeito estribado. Gente fina é outra coisa. Para o pobre, a coisa está sempre feia: o salário-mínimo não dá pra coisa nenhuma.
• A coisa pública não funciona no Brasil. Desde os tempos de Cabral. Político quando está na oposição é uma coisa, mas, quando assume o poder, a coisa muda de figura. Quando se elege, o eleitor pensa: Agora a coisa vai. Coisa nenhuma! A coisa fica na mesma. Uma coisa é falar; outra é fazer. Coisa feia! O eleitor já está cheio dessas coisas!
• Coisa à toa. Se você aceita qualquer coisa, logo se torna um coisa qualquer, um coisa-à-toa. Numa crítica feroz a esse estado de coisas, no poema Eu, Etiqueta, Drummond radicaliza: Meu nome novo é coisa. Eu sou a coisa, coisamente. E, no verso do poeta, coisa vira cousa.
• Se as pessoas foram feitas para ser amadas e as coisas, para ser usadas, por que então nós amamos tanto as coisas e usamos tanto as pessoas? Bote uma coisa na cabeça: as melhores coisas da vida não são coisas. Há coisas que o dinheiro não compra: paz, saúde, alegria e outras cositas más.
• Mas, deixemos de coisa, cuidemos da vida, senão chega a morte ou coisa parecida, cantarola Fagner em Canteiros, baseado no poema Marcha, de Cecília Meireles, uma coisa linda. Por isso, faça a coisa certa e não esqueça o grande mandamento: amarás a Deus sobre todas as coisas".
• Entendeu o espírito da coisa?
"Ninguem é grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar."

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