Com frequência ouço comunicadores
afirmando que o novo governo reclamava da ideologia determinante nos anteriores
e, agora, tão logo eleito, vem com outra ideologia. Fingindo afogamento na
banheira dos fatos, exclamam como quem fala de uma troca de seis por meia
dúzia: “Quer dizer, então, que era só por ideologia?” e acrescentam indignados:
“Estão substituindo todos os ocupantes de cargos por outros da sua ideologia”.
Penso que convém esclarecer que o
termo ideologia se aplica, mais adequadamente, a uma idealização da realidade,
não sendo, por isso, apropriado ao caso. O que aconteceu nesta eleição foi bem
diferente. O Brasil renasceu das urnas e fez opção política por outra
realidade. Sem idealização alguma. Ao contrário do que aconteceu nos governos
anteriores, quando a ideologia fazia ministros no STF, a sociedade explicitou
no voto o que vinha deixando claro nas redes sociais e nas ruas. Optou por
coibir a impunidade, por torcer pela polícia contra o bandido (cujo lugar,
decididamente, é na cadeia), combater a corrupção, proteger a infância,
defender a instituição familiar, enxugar o Estado e acabar com os abusos. Após
duas décadas em que a educação brasileira definhou em qualidade, graduou
analfabetos funcionais, e cresceu – aí sim, - em ideologia, a sociedade optou
por uma educação que privilegie o ensino fundamental, prepare os jovens para
uma inserção ativa e produtiva na vida social e desenvolva valores morais que
entraram em desuso.
O verde e amarelo das bandeiras
que se agitaram nas ruas e praças do Brasil evidenciou que nosso país é amado e
amável, pode voltar a ser uma nação respeitada, parceira das melhores
democracias, avessa aos totalitarismos. E tem sobrados motivos para se orgulhar
de suas raízes e de seus fundadores. Com muita razão, a ampla maioria dos
brasileiros quer esse ânimo nas salas de aula, em substituição aos
desalentadores resultados da pedagogia dos conflitos.
Nada tem a ver com ideologia,
tampouco, a decisão política de privilegiar o interesse nacional em acordos
internacionais, controlar de perto o trabalho da miríade de ONGs que, em muitos
casos, atuam no Brasil, com recursos da União (ou seja, do povo brasileiro), em
favor de interesses estrangeiros muito focados na riquíssima biodiversidade e
no subsolo da Amazônia. É apenas o fim da copa franca, que serviu para o
assalto às estatais, para os escandalosos e ruinosos financiamentos concedidos
pelo BNDES, e para o enriquecimento de quem não precisa de recursos públicos no
setor cultural. Ou não é exatamente isso que o povo quer? E isso nada tem a ver
com “ideologia”.
A ira contra Olavo de Carvalho,
por outro lado, se explica. Enquanto, em universidades brasileiras, tendo eco
na "extrema imprensa", tantos se dedicam a emburrecer os alunos com
doses de ideologia - aí sim - marxista, Olavo, com seus cursos, artigos e
livros atuou no sentido oposto, ensinando milhares de brasileiros a pensar, e
se tornando, de longe, o intelectual que mais influenciou, positivamente, a
virada do jogo político no Brasil.
Por outro lado, é a primeira vez
que eu vejo jornalistas criticando demissão de ocupantes de cargos de
confiança. Certamente são razões do coração. Esperavam que o novo governo
conduzisse suas políticas usando para isso servidores adversários, militantes
do partido que povoou de modo sistemático o serviço público brasileiro? A
última eleição mudou os rumos do Brasil, tanto quanto Lula e o PT o mudaram a
partir de 2003. É bom lembrar que já no final daquele ano, a população
brasileira começava a ser desarmada, tornando-se ovelha sob pastoreio de lobos.
(Percival Puggina, arquiteto, empresário e escritor)
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