Os resultados da última eleição
pontuaram fora da curva de nossa tradição mais recente e trazem novidades.
Teremos um governo pela direita após 20 anos ao longo dos quais o poder
transitou do PSDB para o PT. O primeiro, fundado durante o processo constituinte,
reuniu a esquerda peemedebista; o segundo foi o partido, ainda mais à esquerda,
que lhe fez vigorosa oposição. Essa relação confundiu os termos na política
brasileira. Com dois partidos da mesma vertente disputando o poder, o país
ficou sem direita. Durante mais de um quarto de século de pura insanidade
política, um partido de esquerda representava a direita. Conservadores e
liberais brasileiros não tinham pai nem mãe conhecidos na política nacional.
Numa entrevista logo após a
escolha de Sérgio Moro para o ministério da Justiça, Rogério Forcolen, da RDC
TV, perguntou-me sobre a reação que se podia esperar do PT a essa indicação.
Respondi que não conseguia sequer imaginar o presidente Bolsonaro preocupado
com a reação dos petistas ao tomar uma decisão qualquer. E acrescentei: “Esse
não seria Bolsonaro. Esse foi o FHC”. Rimos juntos. De fato, Fernando Henrique
Cardoso, sempre levou em grande conta o que dizia sua oposição petista. E nisso
se distinguia de Lula que não costumava dar atenção ao próprio partido.
Ademais, a oposição petista se caracteriza por uma conduta sistematicamente
daninha.
Convém ouvi-la? Visando a
enfatizar a legitimidade da tarefa oposicionista na dinâmica das democracias,
um conhecido jornalista ensinava seus ouvintes de rádio, há alguns dias, que a
oposição é detentora de um mandato popular. Imagino que empregasse a palavra
como figura de linguagem porque mandato é atributo pessoal de governantes e
parlamentares. Quem perdeu a eleição e não se integrou ao governo, adota, como
regra, incumbência oposicionista Trata-se de uma consequência natural do jogo
democrático.
Do governante se espera dedicação
ao interesse público, ao bem comum. Seu mandato não é carta branca (para usar a
expressão que está sendo gasta nestes dias) concedida ao vencedor do pleito
para fazer o que bem entenda, como se observou nos quatro mandatos do PT. É
extraordinário, também, que advertências no mesmo sentido já tenham sido
afoitamente verbalizadas por ministros do STF e pela Procuradora Geral da
República após a vitória de Jair Bolsonaro. No Brasil que eu conheço, quem
quiser se preocupar com abusos de poder deve olhar prioritariamente para o STF
(sem desatentar para os partidos providos de braços que agem à margem da lei).
Nessa dinâmica entre governo e
oposição há uma questão ética que precisa ser enfatizada e em relação à qual a
observação do petismo faz acender luzes de advertência. Os limites legais e os
deveres morais serão diferentes entre governo e oposição? Há uma carta branca
para a oposição? Parece óbvio que não. Há limites legais à atividade de todos
em seus mandatos. No entanto, de nossa longa tradição, o compromisso com o bem
comum parece ser atribuído exclusivamente ao governo, restando à oposição o
exercício criativo e folgazão de atrapalhá-lo em suas atividades de gestão.
Isso está moralmente errado.
O exercício do poder político –
mandato popular é poder político – deve ser exercido, sempre, de modo
responsável e tendo em vista o bem comum. Quem perdeu a eleição não recebeu uma
autorização para, legitimamente, promover o caos. Agir para impedir o governo
de governar, ampliar a crise, opor-se alguém a projetos que aprovaria se
estivesse no poder é deslize moral, corrupção gravíssima: é corrupção no
sentido do bem e da justiça!
Os meses por vir nos permitirão
identificar quem são os radicais, em que consiste essa radicalidade e se a
oposição, depois de lhe haver sido negado o governo, merece ser ouvida nessa
tarefa. (Percival Puggina, arquiteto, empresário e escritor)
"Quando alguém partilha
consigo uma informação valiosa e
beneficia com ela, tem obrigação moral de a partilhar com outros."
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