Revelados segredos explosivos de Valério, que teme ser assassinado:
1) Mensalão movimentou R$ 350 milhões; 2) Lula, com Dirceu de braço direito, era o chefe; 3) presidente recebia pessoalmente doadores clandestinos; 4) publicitário se encontrou no Palácio com Dirceu e Lula várias vezes; 5) Delúbio, o tesoureiro, dormia com frequência no Alvorada.
Vocês já viram a capa da revista Veja. A reportagem traz informações estarrecedoras. O
publicitário Marcos Valério sabe que vai para a cadeia - e não será por pouco tempo. E
está, obviamente, infeliz e revoltado. Acha que será o principal punido de uma cadeia
criminosa que tinha, segundo ele, na chefia, ninguém menos do que Luiz Inácio Lula da
Silva, então presidente da República - aquele mesmo que, ao encerrar o segundo mandato,
assegurou que iria investigar quem havia inventado essa história de mensalão, uma
mentira… Reportagem de capa de Policarpo Júnior, na Veja desta semana, revela, agora,
um Marcos Valério amargo e, como se vê, propenso a falar o que sabe - o que tem feito
com alguns amigos. Só que ele está com medo de morrer. Tem certeza de que será
assassinado se falar tudo o que sabe. Acho, no entanto, que ele deveria fazê-lo. Os que
podem estar interessados na sua morte temem justamente o que ele não contou - e a
melhor maneira de preservar o segredo é eliminando-o. Que peça proteção formal ao
Estado e preste um serviço aos brasileiros.
Na sessão de quinta-feira do Supremo, num dia em que não temeu em nenhum momento o
ridículo, o ministro Dias Toffoli - que vinha tendo uma boa atuação até o julgamento do
mensalão (ele decida o que fazer de sua biografia!) - ensaiou uma distinção politicamente
pornográfica entre o valerioduto (cuja existência ele admitiu, tanto que condenou o
empresário) e o mensalão como chama a imprensa… Ficou claro que o ministro acha que
são coisas distintas, como se o empresário tivesse delinquido, sei lá, apenas por interesse
pessoal. A verdade, assegura Valério, é bem outra. Abaixo, seguem trechos da reportagem
de Veja. Reputo como o texto jornalístico mais explosivo publicado no Brasil desde a
entrevista de Pedro Collor às Páginas Amarelas da Veja. Abaixo, uma síntese das nove
páginas.
O caixa do PT foi de R$ 350 milhões
A acusação do Ministério Público Federal sustenta que o mensalão foi abastecido com 55
milhões de reais tomados por empréstimo por Marcos Valério junto aos bancos Rural e
BMG, que se somaram a 74 milhões desviados da Visanet, fundo abastecido com dinheiro
público e controlado pelo Banco do Brasil. Segundo Marcos Valério, esse valor é
subestimado. Ele conta que o caixa real do mensalão era o triplo do descoberto pela polícia
e denunciado pelo MP. (…) “Da SM P&B vão achar só os 55 milhões, mas o caixa era muito
maior. O caixa do PT foi de 350 milhões de reais, com dinheiro de outras empresas que
nada tinham a ver com a SMP&B nem com a DNA”. (…)
Lula era o chefe do esquema, com José Dirceu
Lula teria se empenhado pessoalmente na coleta de dinheiro para a engrenagem
clandestina, cujos contribuintes tinham algum interesse no governo federal. Tudo corria por
fora, sem registros formais, sem deixar nenhum rastro. Muitos empresários, relata Marcos
Valério, se reuniam com o presidente, combinavam a contribuição e em seguida
despejavam dinheiro no cofre secreto petista. O controle dessa contabilidade cabia ao então
tesoureiro do partido, Delúbio Soares, que é réu no processo do mensalão e começa a ser
julgado nos próximos dias pelos crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa. O papel
de Delúbio era, além de ajudar na administração da captação, definir o nome dos políticos
que deveriam receber os pagamentos determinados pela cúpula do PT, com o aval do ex-
ministro da Casa Civil José Dirceu, acusado no processo como o chefe da quadrilha do
mensalão: “Dirceu era o braço direito do Lula, um braço que comandava”. (…)
Valério se encontrou com Lula no Palácio do Planalto várias vezes
A narrativa de Valério coloca Lula não apenas como sabedor do que se passava, mas no
comando da operação. Valério não esconde que se encontrou com Lula diversas vezes no
Palácio do Planalto. Ele faz outra revelação: “Do Zé ao Lula era só descer a escada. Isso se
faz sem marcar. Ele dizia vamos lá embaixo, vamos”. O Zé é o ex-ministro José Dirceu,
cujo gabinete ficava no 4º andar do Palácio do Planalto, um andar acima do gabinete
presidencial. (…)
Marcos Valério reafirma que Dirceu não pode nem deve ser absolvido pelo
Supremo Tribunal, mas faz uma sombria ressalva. “Não podem condenar apenas os
mequetrefes. Só não sobrou para o Lula porque eu, o Delúbio e o Zé não falamos”, disse,
na semana passada, em Belo Horizonte. Indagado, o ex-presidente não respondeu. (…)
Paulo Okamotto, escalado para silenciar Valério, teria agredido fisicamente a mulher do
publicitário
“Eu não falo com todo mundo no PT. O meu contato com o PT era o Paulo Okamotto”, disse
Valério em uma conversa reservada dias atrás. É o próprio Valério quem explica a missão
de Okamotto: “O papel dele era tentar me acalmar”. O empresário conta que conheceu o
Japonês, como o petista é chamado, no ápice do escândalo. Valério diz que, na véspera de
seu primeiro depoimento à CPI que investigava o mensalão, Okamotto o procurou. “A
conversa foi na casa de uma funcionária minha. Era para dizer o que eu não devia falar na
CPI”, relembra. O pedido era óbvio. Okamotto queria evitar que Valério implicasse Lula no
escândalo. Deu certo durante muito tempo. Em troca do silêncio de Valério, o PT, por
intermédio de Okamotto, prometia dinheiro e proteção. A relação se tornaria duradoura,
mas nunca foi pacífica. Em momentos de dificuldade, Okamotto era sempre procurado.
Quando Valério foi preso pela primeira vez, sua mulher viajou a São Paulo com a filha para
falar com Okamotto. Renilda Santiago queria que o assessor de Lula desse um jeito de tirar
seu marido da cadeia. Disse que ele estava preso injustamente e que o PT precisava
resolver a situação. A reação de Okamotto causa revolta em Valério até hoje. “Ele deu um
safanão na minha esposa. Ela foi correndo para o banheiro, chorando.”
O PT prometeu a Valério que retardaria ao máximo o julgamento no STF
O empresário jura que nunca recebeu nada do PT. Já a promessa de proteção, segundo
Valério, girava em torno de um esforço que o partido faria para retardar o julgamento do
mensalão no Supremo e, em último caso, tentar amenizar a sua pena. “Prometeram não
exatamente absolver, mas diziam: ‘Vamos segurar, vamos isso, vamos aquilo’… Amenizar”,
conta. Por muito tempo, Marcos Valério acreditou que daria certo. Procurado, Okamotto não
se pronunciou.
“O Delúbio dormia no Palácio da Alvorada”
Nos tempos em que gozava da intimidade do poder em Brasília, Marcos Valério diz guardar
muitas lembranças. Algumas revelam a desenvoltura com que personagens centrais do
mensalão transitavam no coração do governo Lula antes da eclosão do maior escândalo de
corrupção da história política do país. Valério lembra das vezes em que Delúbio Soares, seu
interlocutor frequente até a descoberta do esquema, participava de animados encontros à
noite no Palácio da Alvorada, que não raro servia de pernoite para o ex-tesoureiro petista.
“O Delúbio dormia no Alvorada. Ele e a mulher dele iam jogar baralho com Lula à noite.
Alguma vez isso ficou registrado lá dentro? Quando você quer encontrar (alguém), você
encontra, e sem registro.” O operador do mensalão deixa transparecer que ele próprio foi a
uma dessas reuniões noturnas no Alvorada. Sobre sua aproximação com o PT, Valério conta
que, diferentemente do que os petistas dizem há sete anos, ele conheceu Delúbio durante a
campanha de 2002. Quem apresentou a ele o petista foi Cristiano Paz, seu ex-sócio, que
intermediava uma doação à campanha de Lula. (…)
Empréstimos do Rural foram feitos com aval de Lula e Dirceu
“O banco ia emprestar dinheiro para uma agência quebrada?” Os ministros do STF já
consideraram fraudulentos os empréstimos concedidos pelo Banco Rural às agências de
publicidade que abasteceram o mensalão. Para Valério, a decisão do Rural de liberar o
dinheiro - com garantias fajutas e José Genoino e Delúbio Soares como fiadores - não foi
um favor a ele, mas ao governo Lula. “Você acha que chegou lá o Marcos Valério com duas
agências quebradas e pediu: ‘Me empresta aí 30 milhões de reais pra eu dar pro PT’? O que
um dono de banco ia responder?” Valério se lembra sempre de José Augusto Dumont, então
presidente do Rural. “O Zé Augusto, que não era bobo, falou assim: ‘Pra você eu não
empresto’. Eu respondi: ‘Vai lá e conversa com o Delúbio’. ”A partir daí a solução foi
encaminhada. Os empréstimos, diz Valério, não existiriam sem o aval de Lula e Dirceu. “Se
você é um banqueiro, você nega um pedido do presidente da República?” (…)
(Por Reinaldo Azevedo)
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